O dia 1º
de julho de 2014 marcou o vigésimo aniversário do plano econômico responsável
pela instituição da moeda corrente no país: o Plano Real. Unanimidade, no
entanto, entre analistas econômicos e sociedade é que esse plano foi
responsável por transformações muito mais profundas. O conjunto de medidas
idealizadas pela equipe do então Ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso
teve como principal demanda o controle dos efeitos nocivos do “Dragão” da
inflação, que minava o poder aquisitivo do brasileiro, bem como a credibilidade
do país junto a investidores estrangeiros.
Com um
pico de taxa de 1703% alcançado em 1993, essa distorção da economia gerava
ondas de supervalorização de preços de bens de consumo da noite para o dia,
acompanhadas de uma corrida do consumidor às lojas para estocar bens de
primeira necessidade. A especulação financeira passou a ser mais rentável do
que a troca de bens de consumo no mercado interno, prejudicando diversos
setores industriais chave do país, o que dificultava ainda mais a estabilização
frente à flutuação excessiva do índice inflacionário.
Para
compreender de que forma o Plano Real foi capaz de conter (e controlar) a
escalada da inflação no país, o Sistema Muito Nervoso (SMN) conversou com o economista Eduardo
André Cosentino – também consultor empresarial, administrador e especialista em
Gestão de Assuntos Públicos – procurando traçar um panorama dos erros e acertos
do referido pacote econômico, bem como mapear os desafios que enfrenta na
tentativa de se manter forte por mais vinte anos:
SMN – Diante do panorama desfavorável
observado na economia durante o governo Itamar Franco – época de implantação do
Plano Real – como se deu a transição da moeda anterior para o novo valor
monetário?
Cosentino
– O plano de implantação foi dividido em três partes: em um primeiro momento,
houve a fase de equilíbrio das contas públicas, alcançado através da redução da
máquina estatal, de medidas que diminuíssem a circulação de papel moeda
(limites de crédito) e incentivo ao mercado interno. A segunda etapa foi
caracterizada pela adoção de uma “moeda virtual” – a unidade real de valor
(URV) – com o papel de facilitar a conversão de valor entre o cruzeiro e o real
– que durante um curto período de tempo estiveram simultaneamente no mercado,
com a cotação da unidade referencial respeitando a equivalência de um para um
em relação ao dólar. A terceira etapa, por sua vez, consistiu na adoção de
medidas de controle dos preços que, como primeira reação, se elevaram. Também
houve medidas como a criação de metas anuais de controle da inflação e da taxa
Selic para regular a incidência de juros nas transações comerciais e a busca
por equilíbrio na relação importação/exportação, desta vez também sujeitas às
variações do livre comércio de mercados.
SMN – Essas novas dinâmicas de mercado
tiveram como efeito fenômenos como a privatização de alguns serviços que antes
estavam sob responsabilidade do Estado. Efeito esse muito criticado à época.
Como você enxerga as privatizações dentro do processo de implantação do real?
Cosentino
– A privatização de alguns setores, como o de telefonia, por exemplo,
contribuiu para a primeira fase da implantação, uma vez que diminuía os gastos
do governo. Serviços não essenciais, que não faziam parte dos pilares da
sociedade, representavam um peso no orçamento da união e, uma vez passando a
funcionar com investimento privado, deixavam de pesar nas contas públicas. O
governo passava então a ter mais lastro para investir no que era de primeira
necessidade.
SMN - Qual foi o setor mais beneficiado
pelas mudanças?
Cosentino
– primeiramente, o setor rural, muito afetado anteriormente pelas oscilações
dos mercados internacionais. Com as medidas de recuperação da economia interna
– e o congelamento da equivalência com o dólar – os produtos passaram a ser
mais competitivos e os mercados passaram a ser mais atrativos para
investimentos estrangeiros.
SMN – Após vinte anos da implantação da
moeda, o que temos visto é um governo trabalhando com índices inflacionários
bem próximos da meta por longos períodos, ao mesmo tempo as taxas tributárias
são bastante altas. Reduzir essas taxas pode ser uma solução para recuperar o
controle desses índices?
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