segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O manto do mendigo



Olhava a cidade passando pela janela do banco do carona, enquanto evitava pensar. Sentia aquele cansaço físico típico de um dia longo de trabalho, acrescido de um certo descaso moral, natural deste início de ciclo. Desviava os olhos das arapucas publicitárias que competiam entre si pela minha atenção, simplesmente porque sei que funcionam e, naquele dia, pretendia manter minha autoestima a salvo.

Foi neste ponto que a rua gritou pra mim, e entre o ruido desarmônico do cotidiano, que sempre me soou mais como uma súplica da pólis que adoece sob um exoesqueleto perfumoso e verde de cidade-sorriso, pude testemunhar o caminhar do mais forte.

Era tudo, menos comum. Seus passos sobrepunham-se ao caminho com superioridade, o cabelo desgrenhado lhe caia como uma coroa. E enquanto seguia dominando cada centímetro do trajeto, sobre seus ombros dormia o manto que é próprio dos grandes homens. Já não lhe importavam os sapatos rotos, pois são marcas dos que sobrevivem; as roupas batidas apenas lhe aumentavam a altivez. E os buracos no manto eram lições de humildade que o rei (ignorado) da pólis dava a meus olhos de burguês.

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