domingo, 28 de julho de 2013

... ou rouba-me o sono

Noite alta, breu do mundo
Recolhe, Morfeu, as jóias
Que esta noite o céu chorou

Dá-me, em sonho, o rosto dela
Os diamantes do seu sorriso
Ou rouba-me o sono, não me oponho
Pois o adormecer é inimigo de todos que amam

domingo, 21 de julho de 2013

Carta de um amor (des)esperado

Uma grande amiga me disse certa vez, inspirada pelas ideias de André Comte-Sponville, que a verdadeira felicidade é aquela que não se espera, que nasce da ausência de expectativas e do contentamento com aquilo de concreto que já se possui. Nem preciso dizer que tal conselho escreveu-se em mim de forma indelével, e que sua veracidade vem se comprovando inúmeras vezes na medida em que o tempo passa.

Sendo felicidade e amor espécie de "irmãos siameses por afinidade" sempre me pareceu natural a extensão desta ideia, de modo a enlaçar os dois e tornar menos nebulosas algumas estradas pelas quais os sentimentos me levam a caminhar.

Clareza e intensidade porém nunca foram grandezas intimamente ligadas e, embora conserve relativa nitidez a respeito da postura (des)esperada a se manter diante de um amor (sim, admito, amor) que, embora se encontre pleno em cada fração da minha alma e em cada letra da minha escrita, não tem se mostrado possível, de modo algum o vejo esmaecendo, nem mesmo com a possibilidade da distância, que hoje vem bater à minha porta.

Consciente da importância do esforço de "não esperar", não posso, no entanto, fugir da necessidade que sinto de expressar o quão assustadora é essa perspectiva. Aprendi a necessitar daquele sorriso no momento em que se abriu pra mim, e, em todos os dias que se seguiram, nunca houve nada que quisesse mais do que apenas viver para vê-lo novamente. Se de fato os ventos continuarem soprando na direção do planalto central, deixarei nos pinheirais muito do que sou agora, a melhor parte do que sou agora.

Compreendo que o fato de enxergarmos o mundo de forma diferente tem muitas vezes nos afastado mas como já diziam os chineses:  "a verdade é um vaso quebrado do qual todos nós temos apenas fragmentos" e é por isso que sinto que cresço muito quando busco me aproximar das suas referências e imagino eu que, sob alguns aspectos (que só você pode dizer quais), haja alguma espécie de recíproca.

A verdade é que hoje se define uma parte importante do meu futuro e não poderia dar esse passo sem dizer que, seja como for, você representa muito mais do que sempre fui capaz de demonstrar e que, embora os versos deste poeta não tenham sido capazes de tocar seu coração, seu nome é a rima mais bonita que já contruí em toda minha poesia

terça-feira, 16 de julho de 2013

Quando ela se vestiu de lágrimas



Escondia o olhar felino por detrás de agruras calculadas...
Trêmulo, o abraço cínico ocupava os veios da ausência,
Enquanto suplicava complacência dos corações feridos.

Escrevia a dor na face com extrema maestria
Nos lábios a displicência das palavras ensaiadas
Dobrou-se em mesuras, se fez honrarias
Pôs na boca a palavra antes maculada

Vestiu-se de lágrimas, se fez condolência
Lamentou o tempo, a ofensa trocada
Embora mostrasse copiosa clemência
A torpe consciência mantinha intocada

sexta-feira, 12 de julho de 2013

A Batalha de Cada Um


" Nada é mais imbecil do que desperdiçar todas as energias em uma guerra. A força espiritual do homem manifestada em tempos de guerra certamente é impressionante, mas porque não usar essa energia em outra coisa? Seria inimaginável começar uma guerra por motivos econômicos. No momento, com a benevolência de sua majestade, estou desfrutando de uma vida aprimorada em seu Império, e se sua majestade me ordenasse ir para a guerra, eu não me recusaria, pois considero que minha mente não é tão frágil a ponto de ser esmagada pela guerra. Mas eu haveria de me pronunciar definitivamente como pacifista. Farei tudo que estiver ao meu alcance para deter essa guerra"
Hachiro Sasaki, 18 anos - Tokio, 15 de Dezembro de 1941  

- Trecho do livro "Éramos Jovens Na Guerra", de Sarah Wallis e Svetlana Palmer

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Adeus à Isla Negra..



Da pele, o sal marinho das tuas letras
penetra os veios do sangue e busca
irmandade com a alma do teu aprendiz.

Generoso, Neruda, permitistes mergulhar os pés
na fonte do teu verso e, como tú, passar
a ser terra, a ser jade, a ser onda, a ser Chile. 

Aprendi, dos teus ouvidos, o som da reza vermelha
do povo araucano, o tilintar fino das agulhas chuvosas e
persistentes, desenhando-se sobre tua capa negra de poeta.

Tive na boca o gosto do trigo...
Das multicolores frutas do Mercado 
... dos seios de Singapura

Mas, também como tú, amei Matilde...
seu amor pelo mar, pela lua, pela areia,
Seu suave entrelaçar de pernas ao dançar

Senti a morte nos lábios quando a Espanha
Rasgou de Lorca o peito e calou suas letras...
Em Granada, saltei-lhe o esquife em honraria

Estive dormindo em tuas reminiscências
Ó copíhue branco do Bosque Chileno
Dividi contigo a barca para Isla Negra...

E, depois de sorrir, amar, morrer contigo
Só resta a mim dizer adeus...  
      

terça-feira, 9 de julho de 2013

Temperando...


Fragrantes, entrelaçados os aromas do meio-dia.
Plácidos, em seus berços poliméricos,
abelhudam os tubérculos...
Segredando o cozer da vida.

Não há sussurro que não se enrede
em fios macarronados...


Nem tempero que falte às anedotas,
Brevemente marinadas em fatos cotidianos.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Veludo e pimenta

Na porta, o homem-átrio se desfez na galhofa do poeta  

Miles Davis, do alto de sua pixelialidade fotográfica,
Vertia mudas blue notes que se derramavam pela parede azul
e morriam sem pairar, sem fluir, sem impregnar o ar...

Curvas de luzes quentes crivavam o chão
de ínfimos e caóticos sóis verdes-rubros...
Ensinando pés ondulantes a dançar.

Almodóvar exibia suas mulheres para o nada
Enquanto os furos loucos e oculares da cantora
agrediam o microfone com seus erres metralhados

No castelo etílico, dourados cachos afogavam as bocas dos copos
Que, como escudeiros, sorviam antes a pimenta
e o veneno duo-colorado. Uma, duas, quatro doses...
E a pista nos convidou a dançar  

E dançamos, vezes molengos, vezes frenéticos
Vezes Vesúvios... Mas sempre poéticos.

Escreve, a morena, seu corpo por entre os espaços
O líder-floresta deixa-se desarmar e abraça a música
O guerreiro-infante costura os primeiros laços de veludo


Enquanto os olhos do poeta transformam veludo e pimenta

Em poesia...               


   

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Infinito de minuto



Pediu um café. Sentou-se à mesa.
Trazia as lembranças emaranhadas
nos fios de cabelo.

A cidade cuspia suas súblicas
Enquanto ele, se bastando, pleno de si,
Orquestrava o próprio infinito.

Café...
... com aroma de devaneio