domingo, 17 de dezembro de 2023

O dia em que "salvei o mundo" junto com Clarice Herzog (e não fiz nenhum registro para provar)

Pois é, até bem pouco tempo atrás, acreditei que poderia mudar o mundo... Quem roubou minha coragem? Lá pelos idos de 2010-13, ao lado de um bando de malucos ambientalmente conscientes, integrava as fileiras do Ecoberrantes, sob a tutela da insubstituível jornalista e ativista Teresa Urban (1946-eterna).

Muito antes do "dia do fogo", do "ir passando a boiada" e do "aquecimento global é coisa de ecochato e impede o desenvolvimento da economia" que - olha só, quem diria? - tem culminado na oscilação extrema do clima que o mundo todo vem enfrentando nos últimos anos, nós, assim como tantos grupos que ousavam pensar no futuro climático, ocupávamos espaços públicos com intervenções artísticas, coleta de assinaturas e manifestações que já alertavam para a importância da floresta em pé, e para os riscos e consequências da flexibilização das leis ambientais no Brasil.

As atividades do nosso grupo na capital paranaense chamaram a atenção do S.O.S. Mata Atlântica, e por conta do barulho que estávamos fazendo, fomos convidados pelo Mário Mantovani para ir até São Paulo colaborar na elaboração da campanha "Floresta Faz a Diferença". E assim fizemos: colocamos as esperanças na mala e fomos - minha querida amiga Bianca e eu - integrar a reunião.

Uma vez lá, sentamos à mesa com pessoas muito especiais, entre elas o inspirador Rafael Jó Girão (que hoje é um dos diretores do Instituto Agir Ambiental) e, claro, Clarice Herzog, a incansável ativista que transformou a perda do marido Vladmir Herzog para os horrores e arbitrariedades da ditadura no Brasil, em propósito e força na busca pela verdade.

Essa mulher é tão forte e relevante para a história deste país que teve a sua história contada no livro "Heroínas desta História", organizado por Carla Borges e Tatiana Merlino e publicado pela Autêntica Editora, além de ser referenciada em uma das obras mais importantes da música brasileira: "O Bêbado e a Equilibrista", de Aldir Blanc e João Bosco, se tornando um símbolo de resiliência entre os que perderam familiares naquele contexto histórico.

Pois bem, entre as lembranças que tenho daquela reunião, a mais marcante delas é a da própria Clarice me perguntando qual era o que identificávamos como o principal desafio de sensibilizar o público para as questões ambientais relacionadas à preservação da Floresta Amazônica. A minha resposta foi, na ocasião, que o principal desafio, para nós sulistas, era mostrar para as pessoas que, mesmo geograficamente distantes da floresta, nossas ações também têm impacto sobre ela, uma vez que as condições do meio-ambiente são afetadas por uma série de sistemas interconectados, um influenciando no equilíbrio do outro.

"Gostei da sua perspectiva, rapaz!", foi o que ela disse após o fim da minha fala. O desafio era mesmo fazer o público em geral compreender que todos nós temos o nosso quinhão de responsabilidade, seja pela forma como nos alimentamos, como consumimos os recursos naturais disponíveis e a forma como esses modelos de consumo definem os padrões adotados pela indústria. 

Preciso dizer que o incentivo e a vivacidade presente nas palavras de alguém a quem eu tanto admirava (e sigo admirando) me fizeram uma pessoa diferente hoje, mais confiante e muito mais determinado a defender da mesma forma tudo em que acredito. Tenho certeza que sou apenas mais uma das pessoas que foram transformadas pelo contato com ela mas se um dia esse texto chegar até ela, gostaria que soubesse que mudou a minha vida.

Não tenho ciência de quantas reuniões mais foram feitas e nem quantos setores das sociedade foram ouvidos até a elaboração final da campanha, mas lembro de ter sentido muito orgulho ao ver personalidades da época portando cartazes e desenvolvendo falas em apoio à campanha que, de certa forma, ajudamos a estruturar. A única coisa que lamento é não ter tido coragem de pedir à Clarice uma foto, embora esse encontro tenha ficado gravado para sempre em meu coração.

Esse aí sou eu colhendo assinaturas contra as alterações do Código Florestal, em 2011 (quanta ingenuidade)

     

    

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